‘Geração mais rejeitada da história’? O sofrimento de jovens adultos com competição sem precedentes por trabalho, amor e dinheiro
Um artigo sugere que a atual geração de jovens adultos seria, talvez, a “geração mais rejeitada em toda a história”. Como isso pode afetar a sociedade?
A atual geração de jovens adultos seria, talvez, a “geração mais rejeitada em toda a história”?
Essa ideia foi sugerida em um artigo do jornalista americano David Brooks no jornal The New York Times após conversas que ele teve com jovens adultos que sofrem rejeição em diversos aspectos da vida prática: desde processos seletivos em universidades ou para vagas de emprego a relacionamentos amorosos ou crédito para compra de casa.
O mundo em geral está mais competitivo, argumenta Brooks — com jovens que saem das escolas precisando aplicar para cerca de 20 a 30 universidades para serem selecionados por apenas uma ou duas delas. Essa rejeição está as acompanhando nas demais etapas da vida, com maior demanda por recursos mais escassos em quase todas as esferas.
E existe um problema grave da rejeição: esse sentimento nos transforma em pessoas mais agressivas, menos inteligentes, menos empáticas e com menos autocontrole.
Quem concluiu isso foi o psicólogo Roy Baumeister, um dos pioneiros no estudo do efeito que a rejeição tem nas pessoas, e que é citado no artigo de Brooks. Suas observações foram feitas a partir de experimentos de laboratórios com voluntários — em que as pessoas eram submetidas a diversos tipos de rejeições, e tinham seu comportamento monitorado.
A primeira reação de uma pessoa rejeitada é uma espécie de torpor dos sentimentos — como se o corpo desligasse sensações por alguns instantes, como forma de impedir a dor.
Mas esse torpor também acabava tornando as pessoas menos empáticas e mais agressivas.
A BBC News Brasil conversou com Baumeister sobre seu trabalho para entender os efeitos que a rejeição pode ter não só nas pessoas como também na sociedade como um todo.
Confira abaixo trechos da entrevista.
BBC News Brasil – Muitas pessoas da geração atual alegam que o mundo está mais competitivo em geral e que elas sofrem mais rejeição hoje do que gerações passadas. Existe mesmo essa ideia de que estamos em um nível recorde de rejeição no mundo? Essa é mesmo “a geração mais rejeitada” da história?
Roy Baumeister – Pode muito bem ser. Certamente é verdade em algumas áreas. Por exemplo, eu sei que as melhores universidades não têm muito mais vagas do que tinham no passado, mas elas têm muito mais candidatos do que no passado.
E por causa disso, as pessoas precisam se candidatar a mais universidades, o que piora ainda mais o problema. E também tem o problema da “inflação das notas” [em que professores dão notas mais altas a seus alunos sem que haja necessariamente maior qualidade no trabalho, para ajudá-los em processos seletivos].
Recentemente, li o novo livro de Peter Turchin sobre a superprodução de elites e ele me convenceu de que isso é um problema. E, claro, isso levará a mais e mais rejeições. Ele diz que nos anos 1960 apenas uma pequena parcela da população se formava em universidades. Agora há muito mais pessoas se formando.
Há mais competição pelo mesmo número de vagas.
Não há necessariamente mais empregos, portanto, mais rejeições ocorrem no mercado de trabalho.
BBC News Brasil – E quais são os mecanismos de defesa que usamos contra a rejeição?
Baumeister – Eu diria: tente novamente em outro lugar. Como descobrimos com o estudo do amor não correspondido, as pessoas se sentem mal até encontrarem outra pessoa e ficam melhores.
Infelizmente, isso significa tentar mais, o que, novamente, aumentará o número de rejeições.
Mas é uma cura. Quando você é aceito, você para de se sentir mal por ter sido rejeitado. Na minha carreira como pesquisador científico, submeto centenas de artigos e muitos são rejeitados. Todo mundo é rejeitado. Você tem que se acostumar.
E você se sente mal quando um artigo volta com diversas críticas e o editor diz: “Bem, desculpe, não vamos poder publicar seu trabalho”.
Mas aí você encontra outra pessoa que o publica. E acaba parando de se sentir mal pelas rejeições anteriores.
Todo mundo sabe que faz parte do jogo. Isso torna as coisas muito mais fáceis.
Extraído da matéria publicada em: https://www.terra.com.br/vida-e-estilo/saude/geracao-mais-rejeitada-da-historia-o-sofrimento-de-jovens-adultos-com-competicao-sem-precedentes-por-trabalho-amor-e-dinheiro,5f2741733ea42e067cbf23a02e72a321g05h1d04.html